´´Por que a originalidade que é admitida sem reservas em nossa literatura nos é negada com todo tipo de desconfiança em nossas tentativas difíceis de mudança social?´´ Foi o que disse Gabriel Garcia Marquez ao receber o Prêmio Nobel da Literatura.
Porque preferimos viver no nosso mundinho quadrado, pequeno e medíocre do que perceber que há lá fora um mundo enorme, colorido e diferente e que nos afronta e nos espera.
Ainda bem que temos o nosso Clube que nos mostra esse mundo novo a cada encontro.
Gabriel Garcia Marquez e sua Mocondo cheia de personagens improváveis, estórias fantásticas, guerras inacabáveis e famílias centenárias. Mais um presente do Clube do Livro!
Ler Cem Anos de Solidão não é tarefa fácil. Mas ninguém do nosso Clube quer facilidade, caso contrário estaríamos lendo Norah Roberts, pelo amor de Deus!
Enfim, preferimos o caminho mais difícil, porém infinitamente mais prazeroso! É como andar léguas para achar uma cachoeira indescritível ou subir uma montanha para apreciar a vista: vale a pena. Abre a cabeça, a alma e o coração.
Como todos os livros do nosso Clube, Cem Anos não foi uma unanimidade. Ainda bem! Assim a discussão fica melhor!
Gabriel Garcia Marquez, um colombiano arretado, já era um escritor famoso quando escreveu Cem Anos de Solidão. Foi sua consagração. O livro mostrou para o mundo a real América Latina e seus habitantes, até então pouco conhecidos no hemisfério norte.
Cem Anos também deu início ao chamado realismo mágico, e logo foi seguido por Jorge Amado, Jorge Luiz Borges e Isabel Allende, por exemplo.
Na sóbria literatura européia, o mágico era coisa de livro de criança, Irmãos Grimm, contos de fadas. Até Gabriel levar Úrsula, Melquíades, e os inúmeros Arcádios e Aurelianos até eles. E até abocanhar o Prêmio Nobel de Literatura com todos esse seu circo.
Foi como se um mundo se abrisse para os sisudos intelectuais: ´´então isto é a América Latina?´´.
Isso e muito mais. É também um continente isolado do resto do mundo por um oceano de águas e de pobreza. Daí a solidão a que ele se refere no título. A solidão de Marquez não é a solidão de cada indivíduo. É a solidão geográfica de um povo condenado a viver sem progresso, sem paz e sem sua própria cultura. Tendo que lutar guerras sangrentas para provar a si mesmo e ao mundo que existe! Tendo que ser medido pelo bastão do Primeiro Mundo, que se esquece que as intempéries da vida não são as mesmas para todos.
´´A interpretação de nossa realidade em cima de padrões que não são os nossos serve apenas para nos tornar ainda mais desconhecidos, ainda menos livres, ainda mais solitários.
A venerável Europa talvez pudesse ser mais perceptiva se tentasse nos ver em seu próprio passado. Se ela recordasse simplesmente que Londres levou 300 anos para construir seu primeiro muro, e mais 300 para ter um bispo; que Roma labutou numa penumbra de incertezas por 20 séculos, até que um rei etrusco a fizesse entrar para a história; e que a pacífica Suíça de hoje, que nos deleita com seus leves queijos e simpáticos relógios, derramou o sangue da Europa como soldados mercenários, no final do século XVI. Mesmo no alto da Renascença, 12 mil lansquenetes pagos pelo exército imperial saqueou e devastou Roma e trespassou oito mil de seus habitantes na espada´´.
´´A América Latina não quer, nem tem qualquer razão para querer, ser massa de manobra sem vontade própria´´. E nós, do Clube do Livro, também não queremos ser assim! Queremos pensar!
E quando no fim da noite de terça-feira, depois de um jantar delicioso preparado por nossa anfitriã, Cidoca Nogueira, depois de um vinho divino, depois de ouvir todos os membros do nosso Clube, finalmente conseguimos perceber que Cem Anos de Solidão é na verdade um grito de liberdade de um povo e de um homem em busca de sua identidade. É também uma ode às diferenças de vida e de pensamento. Uma ode á alegria, ao inusitado, aos humildes, aos corajosos, aos brilhantes. Por que assim é o mundo!
E por isso, e obrigado Senhor por isso, tenho esse Clube! Para me mostrar todos os meses como temos tanto o que aprender!
Um comentário:
Parabéns pelo texto tão sensível ! Vou ler pela terceira vez e vai ser outro leitura . Obrigada . Beijos
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