´´Os Oscars finalmente chegaram, após
meses de polêmicas e especulações.
Um resumão da noite:
A falta de um mestre de cerimônias deu
certo. O elenco de apresentadores foi cheio de surpresas agradáveis: o
apresentador Trevor Noah, comediantes Keegan Peele e John Mulaney, Serena
Williams, e — claro — Barbara Streisand. Muitos artistas usaram o palco para
fazer comentários politicos (como era de se esperar). Logo de cara, Tina Fey, Amy
Poehler e Maya Rudolph fizeram uma piada sobre o muro de Trump, que também foi
mencionado no discurso em espanhol do apresentador Javier Bardém. Peele fez uma
brincadeira com um guarda-chuvas “zoando” Trump, que, em um vídeo que viralizou
na internet, não conseguiu fechar seu guarda-chuvas e o largou na porta do Air
Force One. Alfonso Cuarón, que ganhou por melhor fotografia, melhor diretor, e
melhor filme estrangeiro por Roma, agradeceu à Academia por reconhecer a história
de uma trabalhadora doméstica indígena. Spike Lee lembrou a todos que as
eleições de 2020 estão chegando, e pediu que todos “façam a coisa certa” — um
pedido sincero, mas também um trocadilho fazendo referência a um de seus filmes
mais conhecidos.
Tem sido difícil separar a política dos
Oscars. Em 2016, a campanha #OscarsSoWhite (Oscars tão branco, literalmente)
criticou a falta de diversidade dos indicados aos prêmios, e um grupo de
artistas se recusou a ir ao evento. Outra polêmica surgiu quando Casey Affleck,
que havia sido acusado de assédio sexual, ganhou o Oscar de Melhor Ator em
2017, o ano em que o movimento #MeToo começou a ganhar força. Se a Academia de
Artes deve ou não separar a arte do autor, ou usar a plataforma para mandar
mensagens políticas, eu não sei. Mas enquanto houver controvérsias com qualquer
relevância política, haverá críticas.
Esse ano, a maior polêmica está por trás
de Green Book, que levou a estatueta
de Melhor Filme (e Melhor Roteiro Original).
Green Book é baseado na história real de Don
Shirley, um pianista negro, e Tony Vallelonga, um italiano do Bronx que vira
seu chauffeur. Os dois viajam pelo
sul americano nos anos 60, quando as leis de Jim Crow institucionalizavam a
segregação racial. O título faz referência a um guia que foi publicado
anualmente de 1936 a 1966, indicando locais que serviriam a negros. O filme,
co-escrito por Nick Vallelonga, filho de Tony, foi inicialmente muito bem
recebido. Até que a família Shirley disse que o filme estava repleto de
mentiras. Mahershala Ali, que faz o papel de Don, ligou para a família e pediu
desculpas por qualquer ofensa. Já Nick disse que ele não sabia da existência da
família de Don até o lançamento do filme, e que o próprio Don – que faleceu em
2013 – pediu para que ele não falasse com ninguém sobre a sua história. Nick
disse que a vontade de Don era que a história fosse contada pela perspectiva
dele e de Tony, e assim foi feito. Disso surge uma outra crítica: o filme não
conta a historia de Don, um artista negro, e sim a história de Tony, um homem
branco que, chocado com o racismo e violência sofridos por Don, é transformado
e supera o seu próprio preconceito. Um artigo no site IndieWire diz que é como se Shirley existisse “para ajudar seu companheiro na sua
jornada até a salvação”. E, de fato, Tony é o personagem principal do filme
(tanto que Viggo Mortensen foi nomeado para o Oscar de Melhor Ator, e
Mahershala Ali para o de Melhor Ator Coadjuvante).
Mas, houve grandes vitórias no campo de
diversidade: Ruth E. Carter e Hannah Beachler foram as primeiras mulheres
negras a ganharem prêmios por melhor figurino e design de produção por Pantera Negra. Pantera Negra, que já estava fazendo história sendo indicado para o
prêmio de melhor filme, também ganhou o Oscar de trilha sonora original. Domee
Shi ganhou por melhor curta de animação (se você assistiu Os Incríveis 2 no cinema, você provavelmente viu Bao durante os trailers). Absorvendo
o Tabu, um documentário sobre como mulheres na Índia lidam com o estigma da
menstruação, levou o prêmio de melhor documentário em curta-metragem. O curta
surgiu da ideia de um grupo de alunas de um colégio na Califórnia, que
começaram a arrecadar dinheiro para construir uma máquina para fabricar
absorventes depois de descobrirem que muitas meninas paravam de ir à escola
quando menstruavam, por falta de acesso a produtos de higiene feminina. E também,
sem muita surpresa: Regina King ganhou o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvant (Se a Rua Beale Falasse) e, Rami Malek,
filho de imigrantes Egípcios, o de Melhor Ator (Bohemian Rhapsody), e Mahershala Ali, negro e muçulmano, ganhou seu
segundo prêmio de Melhor Ator Coadjuvante.
As estrelas da noite:
Olivia Colman: coroada Melhor Atriz por A Favorita. Ela não era a favorita (há),
nem a segunda favorita a ganhar o prêmio (essas posições eram de Glenn Close e
Lady Gaga). Chocada e emocionada, Colman deu um discurso engraçado e doce. “Que
hilário, ganhei um Oscar!” Ela disse, antes de dizer a Close que ela não queria
esse resultado. Assista ao discurso completo aqui.
Spike Lee: vestido todo de roxo, em
homenagem a Prince, Spike Lee levou para casa seu primeiro Oscar, após cinco
indicações. O prêmio — de melhor roteiro adaptado, por BlacKkKlansman — foi anunciado por Samuel L. Jackson, que soltou
gritos de animação antes de ler o nome de Spike. Logo em seguida, o diretor
correu até o palco e pulou em cima de Jackson. Spike estava animadíssimo a
noite inteira, mas, aparentemente, quando a vitória de Green Book foi
anunciada, ele jogou os braços pro alto, com raiva, e tentou ir embora. Depois
da cerimônia, uma repórter o perguntou sobre a reação. “Que reação? Achei que
estivesse sentado à beira da quadra no [Madison Square] Garden a achei que o
juiz cometeu um erro,” ele brincou. O filme de Spike também fala sobre racismo, mas de forma mais
agressiva e inusitada, com o estilo clássico de Spike Lee e a dose certa de
humor. BlacKkKlansman é baseado na
história do primeiro detetive negro do Colorado, que infiltrou a Ku Klux Klan.
Pra quem ainda não viu, vale a pena.
Bradley Cooper e Lady Gaga: roubaram o show. A
performance de “Shallow” – que ganhou o prêmio de Canção Original – era talvez
o momento mais esperado da noite, principalmente desde que Cooper fez uma
aparição surpresa em um show de Gaga em Las Vegas e todo mundo achou que rolou
um climão… (Gaga anunciou o términou de seu noivado mais ou menos um mês
depois.) Cooper namora a modelo russa Irina Shayk, com quem tem uma filha, mas
boatos de que ele e Gaga são mais do que amigos vem borbulhando há meses.
Enfim. Eu já achava que os dois estavam apaixonados, e depois daquela
performance de ontem… os dois não pararam de se olhar por um segundo, e no
final, quando Cooper sentou do lado de Gaga no piano… até esqueci a desafinada
que Cooper deu no comecinho da música. Se vocês perderam: ASSISTAM. E Irina estava lá, sentadinha na primeira fileira.
Minha opinião com relação aos prêmios:
Green Book era o único indicado a melhor filme que
eu não tinha assistido ainda. Fui hoje depois da aula e achei o filme ótimo,
mas foi difícil tirar as críticas da cabeça. Continuo achando BlacKkKlansman o melhor filme do ano.
Devia ter ganhado por melhor edição (ao invés de Bohemian Rhapsody). Sobre Roma:
eu entendo por que tantas pessoas se apaixonaram pelo filme, mas achei a
personagem rasa (uma crítica que li atribui a falha ao fato de que a história é
baseada na infância do diretor, e que talvez ele tenha permanecido leal demais
a sua memória). Confesso também que dormi por alguns minutos na metade do filme
(já diz muito…) então talvez tenha perdido alguma coisa. As imagens do filme
são belíssimas, e o prêmio de melhor fotografia foi merecidíssimo. Sobre Rami
Malek: sim, fez um trabalho maravilhoso e era o favorito. Mas eu achei que
Christian Bale e Bradley Cooper foram melhores (sinceramente, ainda não
acredito que Cooper não ganhou nenhum prêmio nessa temporada! Apesar de que,
historicamente, atores que interpretam pessoas reais se dão melhor nas
premiações). Teve gente que achou que A
Favorita devia ter ganhado Melhor Filme... eu não sei. O diretor Yorgos
Lanthimos usou lentes olho de peixe que dão aos lindos cenários um feel de pinturas renascentistas e ao
mesmo tempo, desorientam (de um jeito bom, se é que isso faz sentido). O filme
é estranho, mas interessante, e conta com performances maravilhosas. Mas o
achei o filme um pouco longo demais, o final demorou a chegar e não satisfez.
Fora isso, teria escolhido Spike ao invés de Cuarón por melhor diretor, e
talvez A Favorita e não Green Book por melhor roteiro (talvez) –
mas achei as escolhas justas. (Mas aí volta a pergunta: será que a Academia
deveria ter deixado de premiar Green Book devido às críticas?)´´
Regina King, Ruth E. Carter, and Hannah Beachle (Foto: Getty Images):
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